“Perguntas de 1%” do semestre 99.2

usadas paralelamente ao curso de Geometria Quantitativa no segundo semestre de 99.

As regras eram seguintes:

  • Lucro: a entrega de resposta pode dar 1% da nota final do curso.
  • O trabalho é individual (colagem proibida, excessiva consulta junto aos professores anti-ética).
  • Prazo e lugar da entrega: Coordenadoria ou meu escaninho até 10:00am de segunda-feira.
  • A resposta deve ser curta, legível e bem formulada. Valem somente as proposições de português.

A lista das perguntas

  1. Sistema de coordenadas
  2. Medalha de Fields
  3. Seno e baía: seno é baía?
  4. Redondo
  5. Um poema e a geometria
  6. Medidas chinesas
  7. Uma latida
  8. Latim quase português
  9. A arte de resolver problemas
  10. Príncipe Navegador
  11. Um gato com sorriso
  12. Multiplicações e inferências

Primeira pergunta

Sistema de coordenadas

Há uma convicção generalizada que o sistema de coordenadas foi introduzido no século XVII pelo Descartes. Mesmo que a constatação não é falsa, tem muitos desentendimentos acerca dela e perderia seu tempo aquele que procurasse em sua La géométrie de 1637 qualquer desenho de eixos OxOy. (A idéia de descrever um ponto no espaço dando suas três coordenadas ocorreu já ao Ptolomeu em século II DC.) Em que, então, consistiu a atitude revolucionária de tratamento dado pelo Descartes a geometria – e qual é a ligação disso com o teorema deTales?
Comentário de 1999:

Não posso chamar as seguintes linhas de uma “tradução”. Peguei as frases iniciais da “La géométrie” de Descartes e as – digamos – adaptei a linguagem de hoje. Quis obter a fidelidade ao sentido e não ao verbo. Note que o texto foi escrito há 360 anos, desde então havia mudanças tanto em sentido de termos específicos quanto no modo de compor as frases ou conduzir os argumentos.

PROBLEMAS COM CONSTRUÇÃO
EXIGINDO APENAS RETAS E CÍRCULOS.

Qualquer construção geométrica pode ser descrita desse modo que o conhecimento de comprimentos de certos intervalos já leva a execução dela. Assim como a aritmética consiste de quatro ou cinco operações (quer dizer: adição, subtração, multiplicação, divisão e extração de raízes – e esta operação pode ser vista como uma espécie de divisão), também em geometria para achar intervalos desejados precisa-se apenas adicionar ou subtrair outros intervalos – ou usar uma das operações seguintes: tomando um intervalo escolhido a vontade chamo-o de unidade (e faço isso para sugerir maior possível semelhança com os números) e tendo dois outros intervalos busco o quarto que será tão relacionado com um deles como o outro com a unidade (e esse processo seria o mesmo que a multiplicação). Depois (para aqueles dois intervalos) busco o quarto que tem-se a um deles como a unidade ao outro (e esta vez teria a divisão). Finalmente, busco uma ou algumas médias entre a unidade e um dado intervalo (e agora teria a extração de raiz quadrada, cúbica etc). E não hesitarei de introduzir esses termos aritméticos para a geometria em nome de maior clareza.

Não sou adepto de “embelezamento histórico” de textos matemáticos. Se um livro de geometria analítica menciona que “coordenadas cartesianas foram introduzidas por Descartes” e coloca uma ilustração do dito cujo (sequer explicando o grau de confiabilidade dela) mas nem toca no assunto de sentido dessa frase sobre “introdução”, os estudantes estão levados mais em direção do preconceito do que de conhecimento. Surge uma convicção que antes do Descartes ninguém entenderia a frase do tipo “vá 100 passos em direções daquela árvore e depois 25 passos para direita”. Mas… será que o Colombo não usava os mapas? Ou só depois de Descartes foram inventadas as direções de leste-oeste e norte-sul? Obviamente há algum ponto mais fino nesta estória.

Bem, desde os tempos de Tales sabia-se que a única interpretação geométrica do produto de dois comprimentos é uma área do retângulo com as adequadas arestas. Foi uma grata surpresa quando com a frase citada acima Descartes sugeriu a receita: “pegue os intervalos com comprimentos 1, a, b ajeite-os como mandam as hipóteses do teorema de Tales para que o seu esboço corresponda à proporção a:1 = x:b o quarto intervalo que surge da construção tem justamente o comprimento x = ab”. É surpreendente que durante 2300 anos1) ninguém se deu conta das possibilidades que oferecia o teorema de Tales – mesmo que esse resultado fazia parte indispensável da instrução.

A conseqüência da invenção não era a capacidade de marcar no plano um ponto designado por dois números – digamos 5 e 7 – que corresponderiam às quantias adequadas de certas unidades, traçadas em duas direções – mas a capacidade de marcar pontos descritos por duas expressões envolvendo variáveis e operações aritméticas! O trabalho de Vieta em décadas anteriores consolidou o uso de símbolos gráficos para constantes e variáveis2) – mas agora a capacidade de construir um ponto designado – por exemplo – por x e 2 abria o caminho de duas vias entre a geometria e a aritmética. Portanto a revolução cartesiana apoiava-se em criação da reta numérica. Ou talvez semi-reta, pois a interpretação de “números negativos” como pontos da reta surgiu uns trinta anos mais tarde como efeito de estudos da obra de Descartes, estudos feitos por Isaac Newton.

volteSabia-se há tempo que também um tal de Bombelli no século XVI percebeu isso – a descrição dele foi achada no manuscrito e publicada no século XX. Alguns anos atrás os historiadores da ciência descobriram que Bombelli já divulgou essa descrição no seu livro “Álgebra” publicado ainda em 1572. Portanto, a rigor, o trabalho do Descartes não era em 100% original e inédito – mas foi primeiro que teve uma significativa divulgação e influência social.

volteUma citação curta mas ilustrativa da escrita de Vieta do final de século XVI:

B in A quadratum plus D plano in A aequari Z solido.
– com vogais designando variáveis e consoantes designando constantes (dados); hoje isso seria escrito como
bx 2 + d 2x = z.

Segunda pergunta

Medalha de Fields

A primeira expectativa de Oscar surgiu para Robin Williams em 1989. O filme Sociedade dos Poetas Mortos, aclamado pelo público e xingado pelos críticos, teve 4 nomeações (das quais uma só, de roteiro original, converteu-se em prêmio) e era natural a expectativa que o ator fosse premiado; o papel de carismático professor de literatura inglesa tornava-o um símbolo de um bom e inspirado educador.

Em um dos curtos mas importantes episódios que caracterizavam o ambiente reinante entre o corpo docente, aparecia uma antítese desse personagem, um tal de professor de matemática. Pomposo e chato, pronunciava só uma frase, o estereótipo dos mofados discursos matemáticos sobre rigor e lógica.

Quando o trabalho em outro filme trouxe Oscar para Robin Williams em 1997, tratava-se de novo de jovens e educadores. Esta vez era o papel de professor universitário e terapeuta em Gênio Indomável (que por sinal encontra-se em várias vídeo-locadoras. Por coincidência, o outro Oscar do filme também foi pelo roteiro). E de novo havia um matemático no enredo – mas esta vez figura complexa, interessante e respeitada. Desde o começo do filme sabe-se que esse matemático é um ganhador da medalha de Fields…

Bem, de que se trata? Que tipo de condecoração é essa? Quando é concedida? Algum dos ganhadores da medalha de Fields já atuou no Brasil?

Comentário de 2001: vários estudantes acharam na Rede as informações sobre a medalha (alguém entregou um trabalho em cores com “Fields.gif”) e sobre o trabalho do Jean-Christophe Yoccoz. Foi destacado o fato que ele esteve no IMPA quando o prêmio foi anunciado. Agora, ninguém mencionou o caso mais marcante (pelas implicações científicas e políticas, veja S.Smale, Finding a Horseshoe on the Beaches of Rio, The Mathematical Intelligencer, 20 (1998), 39-44) do trabalho no Rio do Stephen Smale.

Terceira pergunta

Seno e baía: seno é baía?

A maioria desses dicionários que procuram fornecer a etimologia dos verbetes sugere que seno veio do latim sinus. Certíssimo; por exemplo em polonês é preservada a versão latim do nome da função e escreve-se “sin x” com leitura “sinus”. Mas quase sempre sugerem em seguida que o principal sentido desta palavra é  curva, curvatura, sinuosidade é aqui contam uma balela. O sentido desta palavra é  cavidade; baia; enseada – e é difícil suspeitar que uma língua reconhecidamente lógica e precisa fundisse as noções de uma região e da curva marcada por seu bordo. Obviamente, tendo uma instrução escolar os autores de dicionários conhecem a forma do gráfico da função seno e procuram achar sentido no termo que não tem sentido (ou – no mínimo – não tem o sentido esperado); o processo é designado na psicologia como racionalização - o processo de atribuir um explicativa racional a algo que não é bem compreendido. (Por exemplo, uma criança ouvindo que no baralho nove bate sete pega a carta de nove e usa força para bater com ela a carta de sete.) Quer dizer: quando no latim da Idade Média o termo matemático sinus se espalhou, a palavra adquiriu mais um sentido, do certo tipo da curva, mas certamente não foi aqui que o termo matemático teve a sua origem.

Qual foi a palavra (por sinal bastante cotidiana e natural) que originalmente designava a relação entre comprimentos de um dos catetos e da hipotenusa? Por que esse termo tornou-se uma baía?

Comentário de 1999:
DESCOBRI A SUA FONTE

Pois bem, vejo que várias pessoas responderam a pergunta sobre o seno copiando fielmente os aleatórios pedaços das páginas 56-59 do livro de Oscar Guelli. O livro é bom, mas para ler – não para reproduzir.

E não se deram trabalho de ler ainda a página 54, onde consta que Ptolomeu construiu a tabela de cordas percorrendo os ângulos de 30' em 30'… Lendo isso talvez dariam menos destaque para a tabela criada 500 anos mais tarde na Índia com ângulos pulando o valor de um quarto de 15°. Por sinal, o livro de Guelli não menciona a precisão do Ptolomeu – e é algo admirável: 5 algarismos após a vírgula!

Quarta pergunta

Redondo

Qual é a ligação entre o adenovirus, a bola da FIFA e o filósofo grego Platão?
Comentário de 2001: havia quem lembrou-se de sólidos platônicos - ou aprendeu na Rede sobre eles.

Quinta pergunta

Um   poema   e   a   geometria

Permita que cito aqui um pequeno poema:

Traduzindo de russo:
Vladimir Buritsh

Teorema de tristeza

Em um ângulo de cotovelo
Está inscrita a círcunferência da cabeça.

Não precisa
provar nada

De que se trata aqui? Quer dizer: como pôr este quadro em outras palavras?

Você pode dar um outro exemplo com alguma descrição de estado emocional de uma pessoa em termos de simples noções geométricas?

Comentário de 2001: As respostas (até que numerosas) eram impressionantes. Parecia que ninguém estudou geometria ou leu poemas.

Talvez o mais impressionante foi a incapacidade geral de se lembrar de tais palavras usadas na descrição de uma pessoa como curvado, cabisbaixo, dobrado, de braços abertos ou outros.

Sexta pergunta

Medidas chinesas

Na antiga China os agrimensores (funcionários do imperador que mediram os campos para o efeito de cobrança dos impostos) usavam uma técnica de medição diferente da nossa. A figura básica não era o triângulo mas o trapézio (um quadrilátero com um par de lados paralelos, com seus comprimentos denotados ao lado por 12 e a fórmula para medição era a regra seguinte:
a área é qualquer desses resultados: xi  ·  yj , quer dizer
x1  ·  y1 ,        x1  ·  y2 ,        x2  ·  y1 ,        x2  ·  y2 .

Isso significa: pegue um par de lados vizinhos e multiplique os seus comprimentos.

Imagino o que vocês pensam da regra. De fato, injustiças individuais eram quase inevitáveis. Mas no total, a regra funcionou bem, já que ficou sem modificações durante longo tempo.

Qual é a explicação do fato que esse atentado ao senso comum e ao rigor matemático estava dando certo? O que é necessário para que não se caia em graves erros calculacionais?

Se você está disposto de desistir desse quebra-cabeça aproveitando o pretexto que isso deve estar ligado à estranha e antiga mentalidade chinesa, quero lhe assegurar que o fenômeno matemático repete-se diariamente em quase todos os supermercados do mundo… bem, lá onde não se usa os cartões de crédito.

Sim, isto é de novo um desses exercícios (como o do poema de duas linhas) onde Yahoo não deve ajudar muito e não tem como evitar o processo de pensar um pouco…

Comentário de 2001: não me recordo de ter recebido qualquer resposta .

Sétima pergunta

Uma latida

Uma das mais radicais reformas no ensino da matemática em escolas de Estados Unidos (e conseqüentemente em pouco tempo no mundo inteiro) aconteceu em anos 60 porque um cachorrinho latiu. Qual foi o sexo, nome e nacionalidade do cachorrinho?
Comentário de 2001: em geral dentro de cada turma dos estudantes há alguém quem sabe de que se trata. Volto à questão frequentemente, há poucos momentos tão importantes na história mundial de educação.

Oitava pergunta

Latim quase português

In re mathematica ars propendi pluris facienda est quam solvendi

Onde surgiu esta expressão? Qual é a sua tradução? Qual é o seu sentido?

No comentário de 1999 escrevi:
Talvez você queira ver uma parte do artigo da Encyclopaedia Britannica sobre Georg Cantor – isso pode modificar sua opinião sobre alguém que para estudantes de matemática é conhecido em geral só pela associação com o número álef zero e com o conjunto de Cantor
e em seguida citei o artigo da Macropaedia.

Nona pergunta

A arte de resolver problemas

Esta nova pergunta não exige qualquer busca de informações; todos os dados estão fornecidos aqui – e o pedido é de interpretá-los. Lembro que considero improvável o caso de duas interpretações completamente homófonas e tendo redações idênticas vou tratá-las como o trabalho único, com nota a ser dividida solidariamente entre os autores.

Eis a questão: não há muitos livros no Brasil sobre a tecnologia de aprendizagem, livros que serviriam para alunos ou estudantes (em geral: leigos em problemas de pedagogia), ensinando as técnicas de estudo, análise de texto, memorização etc. Um texto desse gênero, específico para o estudo da matemática, do matemático húngaro Pólya György (matemático norte-americano George Pólya, se você prefere) How to solve it – “Como resolver isso” – foi traduzido em português no Brasil como “A arte de resolver problemas”. Bem, o adágio italiano traduttori - traditori indica que a questão de fidelidade do translado de um texto de uma língua para outra nunca era fácil – mas neste caso considero chocante a modificação do sentido do título. Acho que a diferença entre as duas frases ilustra marcantes diferenças entre mentalidade de um matemático e de um empresário (editor) brasileiro. Você saberia comentar o que há por traz dessa modificação?

Por favor, nada de metafísica ou improviso. O material é escasso mas muito concreto. Lembre-se que um paleontólogo precisa menos – as vezes só um pedaço de dente – para propor hipóteses sobre o corpo do bicho e o seu hábitat. Aprenda enxergar a riqueza de informações transmitidas em poucas palavras.

Comentário de 1999:

Muitas informações sobre George Pólya, o herói da última pergunta de 1%, você achará no endereço Polya.html. Aqui vou traduzir algumas frazes, só para despertar o interesse para uma das impressionantes figuras da vida matemática deste século.

Doutorado de matemática em Budapest em 1912. Estudou o direito mas o considerou chato. Passou para línguas e literatura. Para compreender a filosofia passou a estudar a matemática. Uns tempos depois brincou: sou bom demais para filosofia e não bastante bom para física. A matemática está no meio caminho.

Antes de mudar (da Alemanha) para os Estados Unidos escreveu em alemão o esboço do livro How to solve it. Tentou com quatro editores até achar um em USA que publicaria a versão inglesa. O livro vendeu mais de um milhão de cópias.

Há várias famosas expressões dele; quase sempre uma forma jocosa encobre uma reflexão profunda. Algumas citações:

  • Se você não consegue resolver um problema, deve ter um outro problema mais fácil que também você não consegue resolver; pois encontre-o.
  • Qual é a diferença entre método e truque? Um método é um truque que se usa duas vezes.
  • Se introduzida no momento ou lugar errado, a boa lógica pode ser o pior inimigo do bom ensino.
  • Até razoavelmente bons estudantes, tendo obtido a solução do problema e escrito a argumentação, fecham o livro e passam para a próxima tarefa. Fazendo-o percam uma fase importante e instrutiva do trabalho... problema algum jamais está resolvido completamente.
As respostas
Não está acabando o costume de comentar as idéias preconcebidas (em vez de comentar o texto) e de tomar as posições usando atitudes emocionais transmitidas pelos adjetivos (em vez de dissetar fatos que levariam até as atitudes).

…o empresário brasileiro não teve funcionários que tivessem o conhecimento eficaz na área matemática e também na tradução… Muitas acusações com base nula.

… uma editora sem interesses financeiros… Uma editora sem interesses financeiros é uma editora falida. Além disso não me interessa se o editor quer cometer suicídio financeiro ou quer ficar rico, eu pergunto qual é a diferença entre dois títulos.

…  marketing… O quê um rotulamento acrescenta à análise de diferenças entre dois títulos?

Só as respostas da Vera Lúcia, do Luiz Fernando e do Antonio Luiz trazem pequenos elementos de análise mais concreta (e são estas pessoas que ganham o ponto). Há em respostas deles as observações sobre pontos seguintes: “a arte” sugere solução de algum mistério; o título brasileiro sugere a existência de soluções genéricas, pacotes - e não de análise de soluções de problemas concretos; e que supostamente (se acreditar no título daqui) …a resolução não está no conhecimento e sim em regra… que o livro mostrará.

Meus comentários
O primeiro título mesmo sem o ponto de interrogação tem forma de uma pergunta – e por isso é convidativo. O segundo mais anuncia do que convida. O primeiro é fácil de associar com questões matemáticas, o segundo implica um grau de generalidade, incentiva portanto as interpretações mais abrangentes (por exemplo, sobre soluções de problemas no convívio social ou de cunho material). O primeiro usa palavras comuns, no segundo as palavras são mais rebuscadas. Concluindo: o primeiro pergunta e convida (a um trabalho conjunto); o segundo eleva toda questão ao plano mais sofisticado, tem um ar de promessa e de uma eficácia geral.

Vejo aqui que ambos os autores de títulos conheciam as preferências do seu público-alvo. O norte-americano cresce no mundo com um mandamento básico do it yourself – “faça você mesmo”. Os livros que dizem “como fazer” (uma casa, massa muscular, casamento feliz, leite de soja, carreira em grande firma, moldura, computador) vendem sempre. O brasileiro ouve desde a escola primária que “o governo tem que fazer”.

Você aceita a visão e quer culpar os portugueses? Tenho pouco apreço pelas explicações com bases étnicas. Estou convicto que hoje paga-se aqui pelos séculos de preguiça – a preguiça dos ricos, obviamente, possível graças a longa exploração das gerações de escravos, que não tiveram qualquer coisa nem de preguiça nem do mundo de preguiça.

Décima pergunta

Príncipe Navegador

Há um personagem na história da Península Ibérica que desempenhou um papel importante na organização das instituições científicas ocidentais; qual foi o tão respeitado feito dele? Nos últimos tempos ele passou ser conhecido com o “Príncipe Navegador” o que provoca mais uma pergunta: quantos quilômetros (aproximadamente) levou a mais longa viagem marítima dele?
Comentário de 1999:

Seguramente você confirmou no mapa que- delicadamente falando – é um grande exagero chamar D.Henrique um “navegador”. Escrevendo estas linhas não tenho ainda em mão as suas respostas mas estou preparado de ouvir sobre a Escola de Sagres – talvez sobre o papel de um administrador no desenvolvimento de ciência… Não há motivos para contestar o papel da Escola na história mundial – sem dúvida a invenção da caravela e uma obstinação em organização de expedições que iriam cruzar os mares influiu na vida da maioria das sociedades de todos os continentes – mas dependendo da fonte de informações o entusiasmo acerca das atividades do D.Henrique pode mudar de volume. Considere estas linhas (John Ure, Dom Henrique o Navegador, Editora UnB, Brasília 1977)

Os antigos biógrafos do Infante D.Henrique escreveram sobre sua Escola de Navegações de Sagres e insinuaram a existência de uma academia de ciências, mais formalizada do que parece ter sido o caso, à luz de estudos mais recentes. Possivelmente, essa especulação reflete a idéia do século dezoito de que todo o ensino sempre estaria mais bem organizado em torno de centros dessa espécie… Os historiadores do século dezenove viram D.Henrique como um cientista e um estudioso avançado de matemática, navegação e cartografia; extrapolaram, a partir de suas próprias idéias, fatos de pouca evidência histórica.
Procure não esquecer também que se os povos que habitavam a consta oeste da África conhecessem a tal Escola, certamente a veriam como um campo de treinamento de bandidos que pilhavam as suas aldeias e escravizaram os seus habitantes. Uma técnica popular e eficiente era de raptar as pequenas crianças esperando que os seus pais as seguissem. Esses detalhes apareceram em suas aulas de história?

Décima primeira pergunta

Um gato com sorriso

Qual é a ligação do gato de Cheshire com cálculo de proposições?
Comentário de 1999:

Você já sabe (talvez sempre soube) que o gato de Cheshire tem aquele estranho costume que no começo ele está sumindo e só depois desaparece o sorriso dele; que o criador dele, Lewis Carroll, povoou com ele e com muitas outras estranhas criaturas o livro Alice no País das Maravilhas; que quando abandonava a encarnação de escritor tornava-se Charles Lutwidge Dodgson, matemático especializado em lógica e álgebra; que o seu lado matemático passou sem maior destaque na história (injustamente, por sinal) – mas desde 100 anos produz-se pelo mundo afora os trabalhos de mestrado, doutorado e livre-docência sobre a fantasia, os neologismos, os absurdos e a filosofia contidos nos dois livros infantís escritos por ele…

Décima segunda pergunta

Multiplicações   e   inferências

Latim de novo. Esta vez é a frase
Non sunt multiplicanda entia praeter necessitatem.

Sem dúvida você achará a tradução, o nome tradicionalmente atribuido à frase e o autor dela – mas quero um pouco mais. Estou curioso como assumindo esta regra do século XIV você chegaria a conclusão que deve-se rejeitar a hipótese de origem extraterrestre de esculturas da Ilha de Páscoa.

Por favor, leia com cuidado o que eu escrevi. Se porventura você acredita que foram os visitantes de Aldebaran que as trouxeram para a Terra, mantenha calma. A minha pergunta não toca a sua fé (para qual preservo pleno respeito – calçado em uma sólida camada da indiferença). O exercício não é sobre as crenças pessoais mas sobre a maneira como faz-se uma inferência de um certo p a um certo q. A pergunta significa: se você chamar aquela regra de p e a rejeição da hipótese extraterrestre de q, como conduzir o raciocínio para mostrar que p-->q ? Agora, se na sua vida particular você assume p ou não – isso não me interessa, pelo menos enquanto estou no papel do seu acessor em matemática.

Comentário de 2001: havia em respostas as traduções (de melhor e de pior qualidade; algumas pareciam sair do programa humorístico-computacional de tradução automática) e também havia o nome de Ockham – mas aqui terminava a obra. A Rede as vezes fornece uma informação mas por enquanto não ensina a pensar.